quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

de que para lado se torce o pescoço





















Á falta de melhor cabeça para o arejo, ponho assim. E quando digo “torcer o pescoço” não quero literalmente dizer o dos editores que aqui pela pátria são aproximadamente dois. Não porque me faleça a vontade, mas porque para a boa saúde do casal nada sei de tais artes. A pouca estima em que os tenho vem-me do ir vendo ajustes assim: um livro comum, hoje em dia, grosseiramente, anda em coisa que vai dos 14 aos 26€ - entre os três e os cinco contos da moeda antiga. E este “hoje em dia” é importante porque os custos associados à edição baixaram muito significativamente nos últimos vinte anos em resultado da adoção das tecnologias digitais e de “soluções” que agora não interessa expandir. Ora, estes 3-5 mil-réis ainda são uma pipa de massa na carteira do indígena. Mais levianamente até podia pensar-se que os autores andam para aí todos muito biqueiros a passearem-se de iate. Mas sabemos que não é assim. Ainda outro dia o Rentes de Carvalho teve o desassombro de confidenciar no prefácio de um dos seus livros que na edição holandesa tinha sido remunerado precisamente na quantia de 19.90€ em direitos de autor. Depois dá-se o caso de ainda hoje ter visto uma reedição recente da “Madame Bovary” para a qual se reclamavam os tais 3 mil-réis. Dos quais, como sabemos, o desgraçado do autor ou eventuais herdeiros vão ver a ponta de um corno. Cirando pela Bertrand ou pela FNAC, vejo autores, títulos, papel, volume, e acabo com a ideia razoavelmente sólida de que o preço é aferido em função do peso. Vendem-se mais ou menos ao quilo. De onde podemos andar em ver que o Camilo já não se safava a trabalhar que nem mouro para ser pago à linha. O que certamente aconteceria a quem hoje, por absurdo, se iniciasse em tal lavoura na expetativa de um modo de vida, seria levar-lhes a carne ao talho para ser pago em barrigadas de fome.

Mas em cúmulo, o que fazem os safardanas dos editores da carne que os autores lhes levam já temperada?
Por regra e já quase sem exceção, enfarpelam-na em capas que têm a subtileza de uma caixa de nestum; se têm fotografia, é quase sempre palmada de um qualquer banco de imagens, dão-lhe uma ou duas esfregadelas de photoshop e nem chega a passar pelo fumeiro.
E podia continuar muito por aqui mas dói-me o pescoço e tenho que me ir deitar.Porque andei hoje pelos talhos e ora torcia o pescoço para a direita, ora para a esquerda, no violento exercício de ler títulos em estante.
E isso é fatigante e violento. E se uma pessoa vai para ver sem destino ou procura algo e não está para pedir ao funcionário que vá “ver no computador”, fica rapidamente com tendinites e desarvora dali para fora em rancor da extraordinária incompetência, da manifesta ignorância com que se enfeitam no que respeita à anatomia mais elementar da vossa mercadoria. Tenho que me ir deitar.
Então é assim, seus cabrões: na europa continental e mais ou menos por todo o mundo civilizado, os títulos das lombadas devem ser impressos de forma a serem lidos de baixo para cima (pescoço virado para a esquerda). No mundo anglófono é que é de cima para baixo (pescoço virado para a direita). Perceberam? Há regras para estas merdas, seus safardanas. E já agora: entre nós, os índices devem estar no fim do texto do livro. Antes do texto própriamente dito, só nos livros dos outros gajos.
Podia receitar-vos uma meia dúzia de livritos que explicam estas coisas do vosso negócio. Mas embora dedutíveis, são caros, vossas senhorias não os saberiam ler porque são analfabetos e tenho mesmo que me ir deitar.


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